Jornal Raizonline nº 120 de 16 de Maio de 2011 - COLUNA UM - Daniel Teixeira - A maldição da idade
Hoje em dia vivemos - como sempre temos vivido só que com outras configurações - numa sociedade, por isso mesmo, hoje e sempre, paradoxal no plano das idades. Lembro-me dos tormentos passados para ver por exemplo um filme para maiores de 12 anos quando tinha 10/11 anos, da sensação de frustração ao ser barrado à entrada, de fazer esforços para revender o bilhete tornando-me candongueiro involuntário...enfim, eu queria ser mais crescido, ter mais idade, queria ver um dado filme (na sua maior parte 150% mais inocentes comparando com os que se vêem hoje para idades menores ) ... mas enfim, não estou aqui para saudosismos.
Ora quem me barrava a entrada para entrar no cinema, pedindo-me o B.I. era um senhor com alguma idade já: eram todos senhores com alguma idade já que faziam de porteiros naquela velha esplanada de Cinema com bancadas em pedra para os pobrezinhos e com cadeiras de metal para os «ricos» (ou menos pobres, simplesmente) que só funcionava nos 3/4 meses de Verão. No restante do ano era um outro cinema igualmente com os mesmos senhores a fazerem de porteiros e o mesmo drama dependente da maior ou menor atenção (ou disposição) dos «guardas» das idades.
Cresci (acho que é assim para todos) e embora não me fosse indiferente (não tinha família - irmã com idade sujeita à barragem porteiral) acabei por começar a achar normal ou rotineiro este tipo de selecção...breve, esqueci-me de que já fora daquela idade, que já fora barrado à entrada do cinema e até sentia algum prazer em exibir o BI quando solicitado. Puxava lesto da carteira «Ora toma!!» e depois ficava até ofendido pela dúvida...do ou dos velhos porteiros. Reparem que eu escrevi «velhos»...
Naquele tempo não se desrespeitavam as pessoas: ficava ressentido, achava talvez que aqueles «velhos» do cinema não sabiam ver as evidências mas tudo se passava nas calmas: aqueles velhos porteiros entre os 12 e os 15 / 16 anos meus receberam alguns murmúrios da minha revolta...depois recomeçaram a sua função desagradável e dolorosa barrando-me a entrada nos filmes para maiores de 17 anos. Aí quis ter mais de 17 anos...
Resumindo, até cerca dos 20 / 25 quis sempre ser mais velho...depois estabilizei nas exigências por um período que situo talvez até aos 45/50 anos e comecei a não querer ser mais velho, ou deveria ter começado a não querer ser mais velho se a minha filosofia de vida não tivesse encontrado a grande desculpa (a mãe de todas as desculpas) de que ser maduro é bom, óptimo mesmo: o maduro é ponderado, é sabido ou julgam-no como tal, e glória das glórias de quando em vez pedem-lhe conselhos (que normalmente pouca gente segue) mas neste caso também o gesto (o pedido) acaba por ser tudo.
É interessante que, ao atingirmos os 40, 50 anos, não temos mais tanta avidez por uma idade maior, a coisa se reverte. Excelente o mote, muito boa a construção do texto remontando um dos nossos objetos de desejo: o cinema.
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