sábado, 11 de dezembro de 2010

RUMOS - in Inkuna minha Terra (revisto) - Por Manuel Fragata de Morais

RUMOS - in Inkuna minha Terra (revisto) - Por Manuel Fragata de Morais

Victória Pimenta tem actualmente oitenta anos, vinte e cinco dos quais vividos em maravilhadas batucadas de amor. Amor puro e refinado de electricista engenhosa dos prazeres do corpo e dos alívios da alma.
Nas últimas três décadas, auto-reformada, vendera os negócios e remetera-se à reminiscência, à contemplação, não do invivido, mas da curteza da obra a que se dedicara com empenho parceiroso de formiga.

Excepção era feita no seu aniversário, por uma elite de pais e filhos penhorados em ocasional manifestação de carinho, com farra de arromba celebrada até altas horas da madrugada. Esse testemunho advinha do gesto reformador e altruísta de Victória, que só não teve continuidade na geração dos netos, por a madrasta natureza ser exigente, indecorosa e cobradora.

Tudo começara no ano de 1939, numa cidade do litoral angolano, Benguela. Cidade em que raro era a casa, da alta ou pequena burguesia negra, branca ou mestiça, que não tivera seus gaiatos iniciados no prazer dos prazeres, ás mãos da carinhosa Dona Victória, senhora digna e tratada com todo o respeito, não meretriz alguma que dispensasse serviços a troco de moeda ou favores outros desrespeitosos.

Por vicissitudes e incongruências da vida, especializara-se em tirar os tampos a mancebos cujos extremosos pais lhos levavam pelas mãos, a africanizada parisience cegonha já não escorregava pelas cada vez mais afuniladas chaminés dos conhecimentos carnais dos púberes, adquiridos em nocturnas escapadelas com donzelas duvidadas. Também, por religiosamente acreditarem que, sem prescrita alternativa, a masturbação constante, remeteria os danados rebentos para o remidor fogo eterno, ou , pior ainda, os tornaria inapelavelmente tísicos e manetas.

Em 1936, com vinte risonhas primaveras, Victória Pimenta conheceu Arnaldo Lima, galante e bem falado guarda-livros duma próspera firma de muitos secos e mais molhados. Arnaldo, ou melhor, Arnaldinho, português que chegara a Angola uns cinco anos antes, fugindo ás inquiridoras navalhas de três maridos cujas testas ornamentadas pesavam sobremaneira, na lusa metrópole. Como tinha parentes nesta pequena cidade das Africas, para lá se dirigiu.

Conheceu Victória, namoraram ás escondidas durante dois anos, aos dezanove convenceu-a que a hora de comprovar o seu amor chegara. Casaram-se finalmente aos vinte, quando a jovem anunciou que se o não fizessem, apregoaria aos quatro ventos que tinha sido indevidamente abusada na sua inocência e escaldante boa fé. Arnaldinho, dando conta da vida a andar caranguejadamente, concluiu que lhe seria muito mais fácil e proveitoso esposar-se.

O pai dela era próspero comerciante, folgado. O futuro emprego estava automaticamente garantido, talvez mesmo uma sociedade de interesses futuros, sem falar na casa para viverem.
Para os momentos da boémia inveterada e enquistada, as aborrecedoras brancas dos afamados bairros da capital portuguesa, substituí-las-ia pelas lustrosas negras da região e isto sem preocupação de ornamentar a testa de ninguém.

Há muito que aprendera que uma multa resolvia os aparentemente insolúveis problemas sociais dos bons nativos. Por tradição, cornos e corneados era uma coisa que não existia em Africa. Isso era invenção dos capados dos padres e desses franco-mações que não entendiam nada do relacionamento entre raças e dos valores próprios da terra, afirmava de bom tom.

Quando lhe saiu, voluntariamente, das mãos o primeiro cabrito e uns tostões como compensação da desfeita ao desfeiteado, teve a plena certeza que Africa era sua terra natal e seus habitantes seus irmãos. Gente pacífica e compreensiva, nada de navalhas e correrias loucas com fitos de o deixar exangue!

Leia este tema completo a partir de 13/12/2010

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