sábado, 31 de julho de 2010

A pedido do amigo Sherpas - Reflexão de Michel Crayon

A pedido do amigo Sherpas - Reflexão de Michel Crayon

Eu tenho memórias, como toda a gente, penso, salvo ligeiras excepções na sua maior parte resultado de casos patológicos, mas as minhas memórias, ao contrário da larga maioria das memórias que me são descritas por muitos interlocutores que dizem que têm memórias mas não têm memórias destas, não são apenas memórias por ser memórias, por estarem ali naquele canto escondido por estar, não são memórias que ocupam um espaço para que este não esteja vazio. Abreviando: as minhas memórias são memórias com significado .

Pode perguntar-se (e bem a meu ver) se todas as memórias não têm significado e a resposta é: têm sim senhor, todas as memórias têm significado, mas nem todas as memórias têm o significado que as minhas (e de outras pessoas) e que é um significado especial por representarem coisas ou situações com as quais nos identificamos no presente. Posso dar exemplos, até porque acho que fazem falta, também para que as pessoas que me lêem (e são muitas) fiquem a saber aquilo que eu quero dizer.

Começo pela memória que ocupa espaço apenas para não deixar a casinha da memória vazia: uma pessoa pode lembrar-se da data do nascimento só por si, saber de cor e salteado a tabuada dos nove e dos outros todos até nove, lembrar-se que se casou no dia x do ano y e etc. como memórias em si, tipo arquivo ms - dos, mas essas memórias não valem nada neste plano que eu defendo como sendo o plano da verdadeira memória. Mas...

Se eventualmente uma pessoa se lembrar do dia em que nasceu porque chovia torrencialmente, ou porque o obstetra era feio que nem um bode ou mesmo porque a parteira se viu à rasca para o ou a fazer sair, isso já tem o meu definido significado.

Se souber a tabuada (dos até 9) e se se lembrar que conseguiu aprender isso tudo de cor e salteado depois de 256 reguadas, isso também tem significado na perspectiva que defendo e se lembrar que se casou no dia x do ano y e recordar o dia como inolvidável por factos acontecidos nessa data e não pela data em si (que tem de ir procurar para confirmar à gravação no interior da aliança de casamento), sejam esses factos inolvidáveis pela sua beleza ou pela sua fealdade (também depende muito da mulher com que se casou!) se for por um conjunto da razões significantes a coisa tem aquele significado que eu defendo como sendo o significado.

Leia este tema completo a partir de 02/08/2010

2 comentários:

  1. Olá Michel Crayon
    Este texto está uma delícia, a insistência quase cáustica da palavra "memória"transforma-se basicamente num alerta.
    Claro que temos uma memória meramente cognitiga e outra emotiva. Só esta parte daria para um comentário de razoável tamanho. Estes temas fascinam-me e perco-me a desfrutá-los e comentá-los por isso fico-me por aqui.
    Só mais um pormenor que me agradou imenso e gostaria de não deixar em branco: Este tipo de escrita lembra-me muito o nosso grande escritor António Lobo Antunes (queira desculpar se por acaso não gosta dele). A repetição, o subjectivismo, o saltar de pensamentos.... .
    Os meus parabéns com muita admiração.
    Liliana Josué

    ResponderEliminar