sábado, 5 de fevereiro de 2011

COLUNA UM - Daniel Teixeira - A multiculturalidade e a uniculturalidade

COLUNA UM - Daniel Teixeira - A multiculturalidade e a uniculturalidade

Está na moda, embora o assunto seja antigo, falar-se na multiculturalidade. A chamada inclusão também é um termo bastante aplicado neste contexto e o lema «todos diferentes, todos iguais» diz-se hoje quase espontaneamente. O analfabetismo é combatido ou é apontado como um entrave ao desenvolvimento das relações globais que se pretendem. Ser-se adoptante da multiculturalidade, da inclusão (social) e da admissão da diferença é, pois, em certo sentido, uma questão alfabética também.

A alfabetização possibilita o acesso à informação, à informação escrita, mas também tem outra vantagem não muito directa: é que seguindo o sistema naturalmente progressivo quanto maior for a alfabetização local maior será a aceitação local da informação escrita ou falada tendo por base esta última a ideia simples que quem se alfabetiza está em melhores condições de receber e fornecer informação.

Nos tempos antigos, muito antigos, ainda os animais de hoje não falavam, a posse do vocabulário era considerado um factor de distinção e mesmo os sacerdotes, aqueles que para essa função tinham apetência, distinguiam-se pela riqueza do seu vocabulário. Não tenho os números à mão, mas nesses tempos que ainda se prolongam de uma forma mais diluída, supondo que a gente comum utilizava mil palavras por exemplo no seu dia a dia, um sacerdote utilizava cinco mil. Ora isso faz com que quatro mil das sacerdotais palavras não dissessem nada ao comum dos mortais.

Não vou alongar-me muito neste campo bastante mais profundo do que aquilo que uma crónica semanal deve comportar, mas devido a isso, ao facto de terem um rico vocabulário, as pessoas obtinham estatuto, de sacerdote nestes casos mas também quanto maior fosse o volume do seu vocabulário maior era a sua proximidade com o santificado. Os sacerdotes, esses, eram interlocutores directos dos deuses, seguindo um princípio que nem sempre é fácil de aceitar.

Se a larga maioria das população não entendia essas palavras e se elas existiam ou eram ditas tinham forçosamente de ser dirigidas a alguém e esse alguém só podia ser um deus ou os deuses, uma vez que só quem as pronunciava e o seu circulo restrito as entendia e as pronunciava. A palavra, pouco entendida ou mesmo não entendida pelo comum dos mortais era pois o «abre-te sésamo» das portas do céu.

A pergunta que se colocava na altura entre o «gentio» seria seguramente aquela que por vezes se aplica um pouco por todo o lado: para quê utilizar codificações complexas se com codificações mais simples se podiam atingir os objectivos da comunicação?

Visão discutível, é claro: ainda há tempos o Prof. Lindley Cintra foi objecto de abundante controvérsia por ter «reduzido» (em estudo) o português essencial a cerca de mil palavras: quer dizer ter «reduzido» o português àquelas palavras que mais se usam seguindo uma escala de repetição. Nunca apurei se essas mesmas palavras valeriam na mesma tudo se inseridas em contexto de frase...

Leia este tema completo a partir de 7/2/2011


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