sábado, 19 de fevereiro de 2011

JORNADA CREPUSCULAR - POR: DR. MARIO MATTA E SILVA - Habitação degradada abre feridas sociais

JORNADA CREPUSCULAR - POR: DR. MARIO MATTA E SILVA - Habitação degradada abre feridas sociais

Ao prosseguir nesta jornada vou deparando, aqui e além, mas infelizmente por muitos locais dispersos pelo País fora, com bairros degradados, onde se acumulam, em desordem, casas frágeis, cobertas de zinco, com cartão e madeiras, onde entram as intempéries, se junta o lamaçal, e se amontoa o lixo, o sujo ou se dispõem aos focos mais evidentes de doenças de toda a ordem.

Sei bem que estes bairros não existem só em Portugal, mas por cá é que nos toca a nós todos, evidenciando uma sociedade de desigualdades extremas, de incúrias gritantes, no que respeita a uma habitação condigna que todos deveriam possuir. Quando os seus habitantes se envolvem em escaramuças, quando há desacatos, desmandos, violência, armas, droga, rusgas policiais, então lá vimos pelos ecrãs da televisão imagens de horror, evidenciando a desastrosa e pouco saudável forma de vida, em especial de habitabilidade. Uma verdadeira luta pela sobrevivência! Uma pobreza não só material mas de espírito.

As jornadas crepusculares que percorro, levam-me hoje a falar de bairros degradados ilegais, e por isso, constituídos por habitações não licenciadas, quase sempre construídas sem um mínimo de estudos, quer no que respeita ao ambiente quer de saúde, muitas das vezes sem rede de esgotos, sem água potável, sem eletricidade etc.

Quando me lembro das favelas penduradas naqueles morros do Brasil, assusto-me só de pensar como aquilo tudo desaba assim que vem tempo de chuvas, não resistindo às enxurradas. Foi assim no Chile e entre nós, mais recentemente, na Madeira. Afinal a que se deve tão gritante realidade dos bairros degradados?

Temo-los por muitos lados desde os tempos mais remotos, passando pela Monarquia, pela primeira República, pelo Estado Novo e pelo pós 25 de Abril de 1974. Muitos deles foram sendo, nos últimos anos, demolidos, quase sempre por força da construção de circulares, radiais e estradas novas, viadutos ou pontes, indo porém integrar-se noutros bairros ilegais, engrossando-os e tornando-os mais populosos e caóticos.

Tirando essas situações pontuais de obras públicas, o que fazem as autarquias para não permitirem tais construções que vemos na envolvência de várias cidades, como Lisboa, Porto, Setúbal, Faro, Vila Nova de Gaia, Braga e tantas mais? Como estancar de vez a proliferação deste tipo de habitações erguidas contra todos os planos urbanísticos existentes? Como integrar essa população que vive nesses bairros, sem um plano de conjunto, acertado e coerente, dos Serviços de Assistência Social? Nada disto funciona.

Os serviços prestados pelas Assistentes Sociais são sempre de último recurso ou feitos à posteriori, quando ocorrem desavenças entre grupos rivais, desacatos, calamidades naturais… Não existem planos de inserção social (embora se fale dela) que partam das técnicas que estudam para esse efeito e se denominam por isso assistentes sociais e fecham-se os olhos à construção ilegal desalmada, vendo proliferarem bairros deste tipo que se desenvolvem que nem cogumelos pela periferia (por tantos concelhos e freguesias...)

Em todo este labiríntico amontoado de habitações vejo apenas o trabalho de generosas associações particulares de solidariedade ou grupos individualizados de apoio social (mas raramente de saúde pública) que dão o seu contributo a creches, lares, refeitórios, ginásios e outras estruturas, mas, muitas das vezes tudo fica por um gesto solidário que se vai perdendo no tempo e desgastando sem recursos financeiros e humanos suficientes.

Esta é, muitas vezes, uma jornada inglória que cai no esquecimento e no desânimo de nada se poder construir de profundo e duradouro. Para os poderes constituídos esta situação passa ao lado, não existe, ou cai simplesmente no esquecimento dos discursos parlamentares, sem que se lembrem que esta gente, vivendo desta forma desumana, pode contribuir para o alto número de abstenção, sempre que se é chamado a eleições.

Leia este tema completo a partir de 21/2/2011

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