Amor de Perdição - Por Manuel Fragata de Morais
Na Ilha do Cabo não havia quem não conhecesse o Bola de Funji, assim apelidado não se sabe bem porque razões. Talvez pela gordura e indolência.
O Bola era uma paz de homem, manso como um boi .
Era raro vê-lo nervoso ou zangado e passava tão despercebido que nunca se lhe conhecera uma namorada. Arranjara emprego numa sociedade de armadores como mecânico de motores navais, sendo respeitado e o seu trabalho apreciado. Um verdadeiro profissional.
Julieta Neves, igualmente da Ilha, era uma jovem mulher, daquelas que gostam de mandar e habituada a levar razão. Durante muitos anos vendeu peixe; porém, um dia decidiu que não era profissão para si, arranjou um cooperante búlgaro que lhe pagou um curso de informática e lá foi Julieta trabalhar para a Bulgarexport, como secretária.
Infelizmente sua prestação laboral foi uma verdadeira bulgaridade. Até ele, estrangeiro, conseguia escrever melhor português. Acabou-se o trabalho e, por consequência lógica, o patrocínio da bela marítima ao búlgaro.
Após várias outras tentativas, igualmente infrutíferas, descartou um italiano de quem muito gostou, um brasileiro e um jugoslavo. Optou, assim, por voltar à venda do peixe, profissão muito mais artística e conforme a sua natureza expansiva.
Foi com grande espanto, pois, que os locais viram o Bola de Funji começar a andar com a Julieta Neves.
«Aué mana, coitado dele!»..., dizia uma.
«Eh! Vai fazer então o quê, com ela, se nem os cooperas lhe aguentaram!», dizia outra.
«Entafuna ka dya ko ekumanana i diye?», alvitrou uma terceira.*
«Xê, você então, aqui ninguém fala kikongo.», atirou a que primeiro falara.
«Quer dizer que devemos aproveitar o que aparecer...», respondeu a outra.
Bola de Funji subiu na consideração de muitos. Afinal o homem era touro bravo, de boi manso só a aparência.
«Sabe mano», dizia um pescador, «às vezes essas gajas assim precisam é mesmo dum que não lhes ligue muito..»
«Não sei, papá!... Quem já viu o dia casar com a noite? Nunca!... Um só segue o outro, nunca se encontram.», respondeu um outro pescador.
«Mas o que lhe deu então? Nunca lhe vimos com mulher e agora, de repente, agarra logo nessa que já passou em tanta mão que até tem marca.»
«Pode ser que dá certo.»
Durante um ano deu certo, certo até para desconfiar, diziam as invejosas cujos maridos as haviam abandonado. Todavia, para desconfiar nunca houve mesmo nada.
Bola de Funji era bom marido, sempre em casa a horas, salário religiosamente nas mãos da mulher que lhe devolvia um tanto para os cigarros, um filho parido há pouco, enfim, nada para se lamentar. O resto era só inveja, esse sentimento tão comum a toda a gente luandense, que nunca conseguiu aceitar ver o próximo a ter sucesso ou viver tranquilo.
Por seu lado, Julieta Neves sossegara bastante, mantinha o lar com um mínimo de dedicação já que se consagrava ao peixe durante a maior parte da manhã, cuidava do filho e do marido e nunca lhe dera azo a reprovação.
Mas...
Há que haver sempre um «mas» na vida das pessoas. Um dia, Julieta encontrou-se com o italiano, Vittorio, o antigo amante e de quem ela verdadeiramente gostara, a despeito de a ter despedido e mandado embora quando deu conta que escrevia melhor português que ela.
Leia este tema completo a partir de 18/10/2010
Na Ilha do Cabo não havia quem não conhecesse o Bola de Funji, assim apelidado não se sabe bem porque razões. Talvez pela gordura e indolência.
O Bola era uma paz de homem, manso como um boi .
Era raro vê-lo nervoso ou zangado e passava tão despercebido que nunca se lhe conhecera uma namorada. Arranjara emprego numa sociedade de armadores como mecânico de motores navais, sendo respeitado e o seu trabalho apreciado. Um verdadeiro profissional.
Julieta Neves, igualmente da Ilha, era uma jovem mulher, daquelas que gostam de mandar e habituada a levar razão. Durante muitos anos vendeu peixe; porém, um dia decidiu que não era profissão para si, arranjou um cooperante búlgaro que lhe pagou um curso de informática e lá foi Julieta trabalhar para a Bulgarexport, como secretária.
Infelizmente sua prestação laboral foi uma verdadeira bulgaridade. Até ele, estrangeiro, conseguia escrever melhor português. Acabou-se o trabalho e, por consequência lógica, o patrocínio da bela marítima ao búlgaro.
Após várias outras tentativas, igualmente infrutíferas, descartou um italiano de quem muito gostou, um brasileiro e um jugoslavo. Optou, assim, por voltar à venda do peixe, profissão muito mais artística e conforme a sua natureza expansiva.
Foi com grande espanto, pois, que os locais viram o Bola de Funji começar a andar com a Julieta Neves.
«Aué mana, coitado dele!»..., dizia uma.
«Eh! Vai fazer então o quê, com ela, se nem os cooperas lhe aguentaram!», dizia outra.
«Entafuna ka dya ko ekumanana i diye?», alvitrou uma terceira.*
«Xê, você então, aqui ninguém fala kikongo.», atirou a que primeiro falara.
«Quer dizer que devemos aproveitar o que aparecer...», respondeu a outra.
Bola de Funji subiu na consideração de muitos. Afinal o homem era touro bravo, de boi manso só a aparência.
«Sabe mano», dizia um pescador, «às vezes essas gajas assim precisam é mesmo dum que não lhes ligue muito..»
«Não sei, papá!... Quem já viu o dia casar com a noite? Nunca!... Um só segue o outro, nunca se encontram.», respondeu um outro pescador.
«Mas o que lhe deu então? Nunca lhe vimos com mulher e agora, de repente, agarra logo nessa que já passou em tanta mão que até tem marca.»
«Pode ser que dá certo.»
Durante um ano deu certo, certo até para desconfiar, diziam as invejosas cujos maridos as haviam abandonado. Todavia, para desconfiar nunca houve mesmo nada.
Bola de Funji era bom marido, sempre em casa a horas, salário religiosamente nas mãos da mulher que lhe devolvia um tanto para os cigarros, um filho parido há pouco, enfim, nada para se lamentar. O resto era só inveja, esse sentimento tão comum a toda a gente luandense, que nunca conseguiu aceitar ver o próximo a ter sucesso ou viver tranquilo.
Por seu lado, Julieta Neves sossegara bastante, mantinha o lar com um mínimo de dedicação já que se consagrava ao peixe durante a maior parte da manhã, cuidava do filho e do marido e nunca lhe dera azo a reprovação.
Mas...
Há que haver sempre um «mas» na vida das pessoas. Um dia, Julieta encontrou-se com o italiano, Vittorio, o antigo amante e de quem ela verdadeiramente gostara, a despeito de a ter despedido e mandado embora quando deu conta que escrevia melhor português que ela.
Leia este tema completo a partir de 18/10/2010
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